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OPINÃO: "Covid, Vacina e Governança"

Ao final do ano passado, escudada sob estudos que já comprovavam a aparição de novas cepas do Sars-Covi-2, e demostravam sua capacidade de mutabilidade com as novas variações, a comunidade científica brasileira emitiu alerta à população, chamando atenção e fazendo um apelo para a necessidade de que fossem evitadas as comemorações de final de ano, para que não houvesse aglomerações, como sendo a maneira mais segura de contenção da transmissibilidade do vírus, para não colapsar as estruturas de saúde.


Pela incivilidade e ausência de um mínimo de consciência coletiva, o que se viu foi uma proliferação de centenas de festas clandestinas, como se o vírus não mais estivesse em circulação ou tivesse ido passar o final de ano fora do Brasil. No período do carnaval, esse inadmissível e incivil comportamento somente se agravou, mesmo sob os apelos que continuaram sendo feitos pelos infectologistas, epidemiologistas, secretários de saúde - e governadores – estes por meio dos decretos de restrições, igualmente desrespeitados.


Agora a fatura chegou; e o valor que está sendo cobrado é a vida de milhares de brasileiros, somado às filas nas emergências dos hospitais à espera de um leito de UTI, que já não existem em disponibilidade para atender ao número de infectados, antecipando o fato de que muito mais vidas serão perdidas, enquanto o presidente segue sua trajetória como irresponsável disseminador do vírus da morte, ao promover aglomerações por onde passa.


Infelizmente, durante esta semana, batemos os recordes mais macabros da história da pandemia até aqui. Na terça feira, foram 1.724 mortos e na quarta (3.3.2021) 1.840, números que continuaram aumentando, segundo os epidemiologistas com quem conversamos.

São perguntas que se impõem: - quantos mortos vamos ter que contar e chorar? Quantos caminhões-frigoríficos os governos estaduais ainda terão que adquirir para armazenar, em câmeras frias, os milhares de cadáveres ao lado dos hospitais, para que, finalmente, a população se conscientize da imperiosa necessidade de cumprir as medidas restritivas de isolamento social, que são, somente elas, as de que dispomos para salvar nossas vidas, enquanto não temos vacinas para todos?


O colapso no sistema de saúde público e privado, originado pela pandemia, mormente nessa onda, a segunda, somado aos impactos econômicos e sociais, denunciam e situam no centro do debate a incapacidade e a negligência do governo brasileiro para o enfrentamento da covid-19.


Os dados disponíveis, ainda que sujeitos a falhas pela demora dos resultados dos testes, apontam que já são quase 120 milhões de infectados, pouco mais de 65 milhões recuperados, e mais de 2,5 milhões de mortos em todo o mundo, sendo que, desses, mais de 260 mil óbitos ocorreram em nosso País, e o quantitativo continua crescendo.


Essa tragédia não deve ser vista apenas pela frieza dos números, mas, também e principalmente, pelo que significam em termos de vidas perdidas, e a orfandade das famílias que perderam seus entes queridos, muitos deles infectados pelos próprios parentes que não atenderam ao chamamento que vem sendo feito, o que está exigir com máxima urgência uma mudança de comportamento, guiado por uma ação de bom senso e de responsabilidade, de uma significativa parcela da sociedade, que precisa fazer a sua parte no cumprimento dos protocolos sanitários, ainda que o obtuso presidente oriente em sentido contrário.


Uma Outra ação ainda mais importante cabe ao próprio Governo Federal, que, ante o agravamento do problema, precisa assumir o papel que lhe cabe de estruturar uma governança da Covid, para, de modo objetivo, executar um planejamento nacional que possibilite coordenar e unificar as ações estaduais, em articulação com os governadores e prefeitos, no sentido de interromper o agravamento da pandemia, que, pelo número de mortos e infectados, e a desestruturação da economia, já é considerada a maior catástrofe que se abateu sobre o Brasil.


Nessa perspectiva, as ações de isolamento social, por exemplo, deveriam obedecer a uma determinação nacional unificada, e a um padrão mais rígido, e não somente de fins de semana, como vêm sendo adotado por estados e municípios, sem produzir os efeitos esperados.


Consoante essas medidas, os aeroportos e portos, bem como o transporte terrestre interestadual, deveriam obedecer a um controle unificado do Governo Federal, que também poderia incentivar e coordenar a formação de consórcios entre estados e municípios para aquisição de vacinas, medicamentos e EPIs, com grande redução de custos pelos ganhos de escala nessas compras, como sugere o professor doutor Flavio Ataliba, secretário executivo do Planejamento e Gestão do Governo do Ceará.

É de saber global o fato de que a pandemia trouxe para o centro do debate, em escala planetária, dois dos mais graves problemas, que em maior ou menor grau, atingem todas as nações - as crises sanitárias e econômicas, com agudo influxo político e social, nomeadamente nos países em desenvolvimento como o Brasil, onde o problema é miudamente discutido de modo maniqueísta, como se saúde e economia fossem antagônicas e excludentes.

Todos são conhecedores, também, da realidade corrente do coronavírus, que expôs, de modo dramático, as dimensões da saúde coletiva e do desenvolvimento econômico-social como inexoravelmente vinculadas, sendo ao mesmo tempo um erro e uma falta de visão o antagonismo que o presidente da República tenta artificializar entre economia e saúde, somado ao seu comportamento de negação a todas as recomendações da comunidade científica em relação ao cumprimento dos protocolos sanitários, o que concorre para aprofundar ainda mais os rebatimentos da pandemia sobre a parcela mais pobre da população.


Na segunda onda, uma governança unificada para a Covid se faz ainda mais impositiva, e o desafio que se infunde ao governo é o de que o modelo a ser assumido articule todas as variáveis subjacentes à desestruturação da economia e do sistema de saúde, como consequências da aparição das novas cepas do vírus e a velocidade com a qual se dissemina.


É notória, divisada por toda a população nacional, a realidade de que os governadores, assim como os prefeitos, em todo o País, cobram insistentemente do Governo Federal uma governança centralizada da Covid, especialmente para a fase da segunda onda, quando a campanha de vacinação é a principal política que o governo, por intermédio do Ministério da Saúde, é capaz de oferecer às unidades subnacionais.


É surpreendente que, também nessa área, se observa uma ação pouco eficiente, em especial, na aquisição de vacinas já disponíveis em todo o mundo, não obstante a ANVISA se haver mostrado diligente em aprovar tanto os registros provisórios para esse período emergencial, e até o registro definitivo para a vacina da Pfizer, único laboratório que tem condições de atender uma maior quantidade de doses, para imunizar a população, mas que o governo somente essa semana resolveu anunciar a contratação desse imunizante.


Ante o negacionismo e as posições erráticas do presidente, recorremos mais uma vez aos Titãs, para perguntar aos cidadãos: será que “[…] o acaso vai ‘nos’ proteger, enquanto ‘andarmos’ distraídos” – dizemos - sem cumprir com as medidas restritivas, como determinam os protocolos sanitários?




Arnaldo Santos é jornalista,

sociólogo e doutor em Ciências Políticas

e colunista do Jornal OPOVO





Comentários e críticas para: arnaldosantos13@live.com










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