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Mente & Corpo: Matrix e a Sociedade do Cansaço

“Aqui vai um conselho: os agentes são maus, mas, aconteça o que acontecer, fique bem longe do Marketing.” Neo, na demo do jogo Matrix Awakens - Unreal Engine 5



Depois de 20 anos do lançamento do filme Matrix, os jovens do início dos anos 2000, sentiram-se tentados a ir aos cinemas, em pleno final de semana do Natal de 2021 e munidos com sua carteira de vacinação do Covid para assistir Matrix Resurrections.


Quem não assistiu ainda, corre para as redes sociais, sites especializados, críticas (com ou sem spoilers), analisados, comentados para tentar obter a resposta: Matrix Resurrections vale o ingresso? Para isto, eu recomendo os vídeos do crítico de cinema e cearense P.H. Santos – que me inspiraram a escrever este texto – pois a minha pergunta não é sobre o entretenimento do filme, mas:


O que teria a nos dizer um novo filme de Matrix?

Os jovens de 2021 não conseguem mensurar a importância e relevância de um filme Matrix (1999, HBO MAX). O impacto no áudio visual tem repercussões até hoje. Efeitos especiais arrojados, figurinos que influenciam a moda em nossos dias, o ressurgimento da estética cyperpunk, iniciada em Blade Runner, que vem do mix ficção cientifica do início do século e o estilo dos mangas japonesas.


As irmãs Wachowski Lilly e Lana – que fizeram a transição de gênero para mulheres trans, uma delas inclusive durante a filmagem das sequências de Matrix – largaram os respectivos cursos universitários e iniciaram suas carreiras como roteiristas na Marvel Comics. Figurões da indústria do cinema viram potencial e entre um fracasso inicial como roteiristas e um primeiro sucesso com um filme de baixo orçamento como diretoras, apresentaram o projeto Matrix, que foi produzido com certa descrença e teve baixo investimento de Marketing. Por isto, foi criado um website apenas com a pergunta: O que é a Matrix? O sucesso do filme dependeu exclusivamente da propaganda boca-a-boca.


Mas, afinal de contas, o que é a Matrix?

Conversando com a jornalista Mariana Beltrão para a live que iremos realizar sobre o tema, ela disse: “E se tudo que eu estivesse vivendo fosse uma mentira?” Matrix é uma mix de Taoismo, Simulacro e Simulação, livro do filósofo Jean Baudrillard e o anime Ghost in the Shell. Portanto, Matrix é uma alegoria que sugere a audiência a possibilidade de que o “sistema” pode ser o impeditivo de você se tornar o que você de fato é.


A tradição nasceu na Psicanálise do professor Sigmund Freud, no qual para saber a origem das doenças mentais se faz necessário observar como a sociedade tenta moldar o comportamento dos seres humanos. Meio século depois, o psiquiatra e pai da Terapia Cognitivo Comportamental Aaron Beck, postulou como biopsicossocial – fatores biológicos, psicológicos e sociológicos – como sendo fatores que desencadeiam as doenças mentais. Portanto quando o sociólogo Byung-Chul Han, sul coreano lançou em 2010 o livro a Sociedade do Cansaço, ele fez uma fotografia fiel do momento em que vivemos.


A pergunta de Byung-Chul Han é por que temos uma sociedade mentalmente doente com casos crescentes de depressão, transtorno de déficit de atenção e hiperatividade, transtorno de estresse pós-traumático e Síndrome de Burnout (esta última passa a ser considerada doença incapacitante a partir de janeiro/2022)? A resposta sugerida em seu livro é porque nos tornamos a Sociedade do Cansaço.


Antes, a Sociedade Moderna (1945 até 1991), era regida pelo dever, no qual o indivíduo tem um papel específico, ser um agente passivo e/ou não reativos, tínhamos apenas uma tarefa a fazer, tínhamos facilidade de manter a atenção profunda e isso gerava negatividade e tédio – este último é essencial para o descanso da mente e o desenvolvimento da criatividade.


Atualmente vivemos na Sociedade do Cansaço (2000 em diante), na qual os indivíduos têm que ser multitarefas, serem capazes de autogerenciamento, almeja o máximo de poder, por isto, nos tornamos positivamente tóxicos, não podemos nos sentirmos tristes e principalmente somos tão hiper estimulados para que nós não sentirmos entediados – com isto, não podemos descansar e tão pouco sermos criativos – uma das maiores exigências do mundo atual.


Matrix Resurrections, nos apresenta um Neo apático, pouco criativo e focado, fazendo terapia e tomando medicamento – ao que parece ser sintomas semelhantes ao transtorno de estresse pós-traumático – cercado por tudo que tecnologia e o dinheiro pode trazer. Num mundo em que todos o bajulam por ter feito algo que impactou a vida daquelas pessoas há 20 anos atrás. Devido ao estourou o orçamento do seu novo projeto, passa a ser pressionado pela amada companhia a Warner a fazer a única coisa que de fato não queria fazer – voltar para Matrix.

“Não queria ter passado pela minha transição, toda essa perturbação na minha vida, o sentimento de luto pelos meus pais para voltar a algo que já fiz e meio que andar por um caminho que já andei parecia emocionalmente insatisfatório”.

Lilly Wachowski, cocriadora dos filmes Matrix


Quando a Warner disse que iria fazer um filme de Matrix de qualquer jeito, Keanu Reeves afirmou que só voltaria a franquia se as criadoras originais aceitasse. Pela primeira vez sozinha, Lana aceitou fazer este filme porque em suas palavras: “depois da perda dos meus pais e do meu melhor amigo, as únicas pessoas que eu amo e consigo trazer de volta são o Neo e a Trinity.”


A metalinguagem neste filme, lembra a comédia ‘A Rosa Púrpura do Cairo’, de Woody Allen, no qual o protagonista do filme sai da tela de cinema por se apaixonar pela espectadora que vai assistir o mesmo filme todas as tardes. Muito do que se vê neste novo Matrix, ignora a urgência e senso de propósito visto no primeiro filme. Isto é reforçado pela nova versão de Morpheus interpretada pelo excelente Yahya Abdul-Mateen II, que mais parece um personagem pomposo de Guardiões da Galáxia do que o sério e austero Morpheus, do excepcional Laurence Fishburne.


A motivação para o desenvolvimento da nova Matrix lembra mais Monstros S/A do que a série de distopia Black Mirror, cuja produção está em pausa, porque o Show Runner disse que a pandemia de Covid fora mais devastadora para humanidade do que a manipulação dos algoritmo.


A trilogia Matrix e a antologia Animatrix, permanecera por anos como o símbolo da virada do milênio, como um presságio de como o futuro distópico poderia ser, se não estivéssemos atentos de uma pretensa guerra entre humanos e a inteligência artificial.

Na vida real, pílula vermelha se tornou um símbolo da extrema direita, e usado como gíria para aqueles que haviam acordado do sistema imposto pela acessão ao poder das esquerdas iniciado no começo do século na Europa e América Latina.


Quando um quarto filme da série foi anunciado, Lilly mandou para aquele lugar pessoas como Elon Musk e Ivanka Trump, com visão política de direita, que afirmavam ter tomado a “red pill”. Assim como Santos Dumond, que viu seu desejo de voar como pássaros sendo utilizado para jogar bombas nas pessoas, Lana preferiu implodir inclusive os conceitos da trilogia original do que ver pessoas usarem de forma distorcida sua criação.


Matrix Resurrections será assistido pela nostalgia, inclusive, este é um dos diálogos deste filme:


“Nada como um pouco de nostalgia para diminuir a ansiedade”. O novo Morpheus, Matrix Resurrections


Existe um público que adoraria que Matrix fosse significativo paras novas gerações. Neste caso, o caminho natural paras as Wachowski era deixar sua cria em outras mãos. Assim como David Filoni tem feito com feito com o mundo de Star Wars, criando histórias que se passam no mesmo universo e não tem conexão com os personagens principais. Matrix será mais bem aproveitado no futuro por outras mídias – seriado, gibis, mangas, animes e games – e por outros criadores de conteúdo.


No fim, vale a máxima, a quem pertence a obra de arte, ao artista ou ao público? Uma parte do público irá se decepcionar porque não honra o legado e outra parte porque este filme tenta ser “lacrativo”.


É impossível prever como as pessoas interpretam arte, um mesmo objeto pode ser admirado por pessoas de posições políticas diferentes, usando a mesma obra para defender suas ideias e ideais, mesmo que antagônicas sejam suas posições. No fim, estamos pleiteando as mesmas coisas, mas o que impede o avanço no campo do diálogo e a necessidade de ter razão.


A melhor resposta mais interessante é do pintor Salvador Dali, que quando fora questionado sobre o significado de suas pinturas, respondeu: “não me pergunte o que significa o que eu pinto, eu mesmo não entendo”.


Aproveito para deseja um 2022 no qual vocês comecem a compreender o quanto o tedio é valioso para vida e sua saúde mental.


Fonte:

Canal do P.H. Santos




Psicóloga Masilvia Diniz

@psicomasilviadiniz

Psicóloga Clínica - CRP-06/89266

Atendimento Online para Brasileiros que vivem no Mundo.










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