Versão da PEC aprovada cria um “subteto” para os precatórios, equivalente ao gasto com essa despesa em 2016, corrigido pela inflação.
A Câmara dos Deputados aprovou nesta terça-feira, por 323 votos a 165, a autorização para que o governo federal não pague parte de suas dívidas judiciais (precatórios). A proposta de emenda constitucional (PEC) criará um limite anual para pagamento dos precatórios equivalente ao valor quitado em 2016, corrigido pela inflação do período.
O governo propôs esse mecanismo para conter o “meteoro” dos precatórios, que vem crescendo anualmente acima da inflação, enquanto o espaço para despesas, estabelecido pelo teto de gastos, cresce apenas pela inflação (medida pelo IPCA). Em 2022, o governo federal teria que saldar R$ 89 bilhões em dívidas judiciais.
A versão da PEC aprovada pela Câmara cria um “subteto” para os precatórios, equivalente ao gasto com essa despesa em 2016, corrigido pela inflação. No próximo ano, isso fará com que R$ 45 bilhões sejam quitados e outros R$ 45 bilhões tenham o pagamento postergado para o ano seguinte – quando novos precatórios serão emitidos, criando uma bola de neve.
Como mostrou o Valor, isso fará com que nenhum precatório comum (referentes a contratos quebrados, desapropriações mal avaliadas ou impostos pagos a mais) seja pago em dinheiro e que parte dos alimentares (de dívidas de salários e aposentadorias, por exemplo) fique sem quitação. Como alternativa, o credor poderá usar esse título para abater uma dívida com o governo, comprar ações de uma estatal ou imóveis públicos, ou aceitar desconto de 40% para receber em dinheiro.
A deputada Perpétua Almeida (PCdoB-AC) criticou o projeto. “Essa PEC ficou conhecida com a PEC do Calote. Calote na educação e calote no direito do cidadão que recorreu à Justiça”, disse. O líder do PSB, Danilo Cabral (PE), afirmou que a oposição alertou que o teto criaria problemas. “Na prática, aqueles que conceberam o teto dos gastos que eles mesmos conceberam”, criticou.
Relator da PEC, o deputado Hugo Motta (Republicanos-PB) defendeu que o “crescimento vertiginoso” dos precatórios é insustentável e que a mudança é necessária para o pagamento de R$ 400 a famílias carentes em 2022.
Teto de gastos
Pouco antes, a Câmara dos Deputados aprovou, por 316 votos a 174, mudança no teto de gastos incluída na proposta de emenda constitucional (PEC) dos Precatórios. O texto foi aprovado com apoio dos partidos aliados ao governo e do PSDB, sigla que tenta se cacifar como “terceira via” para disputar a Presidência contra o presidente Jair Bolsonaro.
O espaço para gastos hoje é calculado com base na inflação de julho a junho do ano anterior, mas o governo Bolsonaro pretende mudar o período de correção para ser de janeiro a dezembro do ano anterior – aproveitando que a inflação cresceu no segundo semestre deste ano, o que permitirá que execute mais gastos em 2022, quando ocorrerá a eleição.
Com a mudança no teto, aliados do governo pretendem, além de pagar R$ 400 a 17 milhões de beneficiários do Bolsa Família, aumentar os recursos para obras de indicação dos parlamentares governistas, elevar o fundo eleitoral de R$ 2,1 bilhões para R$ 5 bilhões, cobrir o reajuste de despesas obrigatórias (como salário mínimo) e abrir espaço para outros gastos, como manter a desoneração da folha de salários de 17 setores.
O MDB propôs requerimento para suprimir todas as mudanças no teto. “Esse destaque preserva a responsabilidade fiscal. Dá a oportunidade dos deputados que defendem o liberalismo defendam o teto de gastos”, disse o líder do MDB, Isnaldo Bulhões (AL). “A narrativa sobre o propósito para aprovação dessa PEC é a criação de um programa social para substituir o Bolsa Família. Isso pode ser feito só com a mudança nos precatórios”, afirmou.
O relator, deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), defendeu que a pandemia obrigou o governo a antecipar a revisão da regra – a possibilidade de mudar o indexador que corrige o teto em 2026 será revogada caso a PEC seja aprovada. “Esse deputado votou a favor do teto de gastos e entende a necessidade do rigor fiscal, estar com as finanças públicas equilibradas, mas a pandemia prejudicou as famílias e obrigou a antecipação da revisão para 2021”, disse.
Apesar de terem votado contra o teto de gastos no governo Temer, os partidos de oposição se posicionaram contra a mudança da PEC. Para o deputado Ênio Verri (PT-PR), a PEC cria uma engenharia fiscal para permitir mais gastos para o governo e para o Centrão. “Isso é imoral, é uma mágica para financiar as emendas de relator”, disse.
Já o PSDB orientou a favor da mudança no teto de gastos, embora a direção do partido tenha criticado a PEC. “Quero cumprimentar o deputado Hugo Motta pelo excelente trabalho e votando a favor do pagamento de R$ 400 para 17 milhões de famílias que estão sem ter o que comer no dia a dia”, disse o deputado Célio Silveira (GO), que é vice-presidente do PSDB.
O deputado Mauro Filho (PDT-CE), secretário licenciado de Planejamento e Gestão do governo do Ceará, afirmou que a PEC abre brecha para o Congresso ampliar artificialmente as estimativas de inflação e jogar para o próximo governo, em 2023, a obrigatoriedade de cortar os gastos. “Vão estimar uma inflação de 11,5% e a oficial será de 9%. E a correção dessa discrepância ficará para 2023, quando deveria ser no ano em curso”, criticou.
Fonte Valor Investe
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